sexta-feira, 28 de março de 2014

Momentos tristes sem ela - Parte Um

  Não vamos com cerimônias. Meu nome, por exemplo, não importa... Não agora. O seu eu, sinceramente, não quero saber, afinal, não tenho nada a fazer com ele, então guarde para si ou para quem se importa. O que você faz aqui eu não sei, não consigo compreender, mas se está aqui é por algum motivo. Se nenhum, acho que lhe darei um: Vou contar-lhe a minha história. De como vim parar aqui nesse buraco que cheira a mijo e rato morto.
  Não é nada de mais, apenas a decadência de um homem feito que, por amor, veio parar na prisão. Não quero fugir daqui, afinal, tenho que pagar pelos meus pecados. Mas ainda acho que fiz a coisa certa. Ela não merecia. Logo logo você verá. Preste atenção no que eu vou dizer.
  Eu era um psicologo renomado, rico [não esnobo, apenas digo a verdade], aliás, muito rico. Vivia com os meus pais, sim, mas afinal, com uma casa daquele tamanho alguém tinha que ocupar. Não achava ruim, quase não os via, mas tinha certeza de que estava bem. Certo dia, voltando para casa, vejo na praça em frente uma moça suja, toda acabada, cabelos crespos e pretos como carvão falando, sobre uma caixa de madeira, sobre coisas que ninguém quer ouvir, não normalmente.
  Ela falava de amor, recitava, se me lembro bem, uma poesia de Drummond. Algo sobre as sem-razões do amor ou algo parecido. Porem, algo nela me atraiu. Seus olhos que, mesmo de longe, poderia ver sua alma, seu espírito. Logo pude ver que, debaixo de tanta sujeira haviam traços lindos em seu rosto. Decidi me aproximar. Ah! se eu pudesse reparar os meus erros, afinal, esse foi o primeiro passo de minha ruína. Mas, no meu lugar eu garanto que qualquer pessoa faria o mesmo. Ela despertou algo em mim, algo que estava morto há muito tempo e que eu nem lembrava que existia. Algo que, mesmo hoje eu não consigo decifrar o que é.
  Decidi então me aproximar e falar com a moça que estava triste ao olhar a sua pequena caixa de esmola com apenas 25 centavos jogados por um menino que passava por lá. Sobre toda aquela sujeira e podridão, o brilho de uma lágrima solitária rola pelo seu rosto, parando antes de chegar ao queixo. Decido, então, quebrar o silêncio.
  - Oi. Estava vendo ao longe você e pensei... não gostaria de conversar um pouco comigo? Digo, lá em casa?
  A moça estranhou e, após pensar um pouco, aceitou o convite, com um olhar assustado, movimentando a cabeça.
  Silenciosamente ela me acompanhou até em casa. Ela ficou com medo de entrar. Envergonhada demais pelo contraste. Fui com ela até o meu banheiro. Dei-lhe uma toalha e privacidade, falando que poderia tomar um banho sem nenhum problema. Deixei sob a porta, alguns minutos depois, roupas limpas para que, quando saísse, tivesse o que vestir.
[sirene]

  Bem, o meu horário acabou. Venha semana que vem que continuarei de onde parei. [suspiro]. Voltemos ao inferno.